sábado, 21 de maio de 2011

Miragem

Som de goteira e cheiro de lama. Uma velha casa, parcamente iluminada. As paredes, cimentadas e pintadas de branco, destacam-se mais do que os faladores devidamente acomodados em seus assentos. Há poucas pessoas, mas só uma vê, e fala, o que há pra ser visto. Ou quem.
Há uma breve despedida. Como chegara, ausentara-se - um cumprimento e poucas palavras. Anda calma e furtivamente; a armadura negra reluz, e a longa trança negra, com poucos fios vermelhos, move-se suavemente a cada passo. A estrada, com poucas casas amplamente afastadas umas das outras, algumas gramíneas e sem nenhum asfalto, queimada pelo sol acima de sua cabeça, está deserta. "Nunca tinha visto um dia tão amarelo..." Na verdade, já. "Melhor tirar os óculos", pensou, tentando rir de sua própria piada.
Um facho de luz corta o seu rosto, rapidamente coberto com uma das mãos, e é seguido por uma onda brusca de energia, impactando-a de frente e a fazendo parar. Tinha certeza de que estava muito perto, naquele momento. Alguns metros à frente, avista uma criança, de pele bronzeada e mui mirrada. Ela olha rapidamente em sua direção, e um novo facho, desta vez vindo dos olhos felinos do menino que a encarava, traz a certeza que estava esperando.
Ele começa a correr. O vulto negro sentiu a saliva escorrer por entre os lábios e seguiu na direção do rapazote, tão rapidamente quanto podia.
A corrida levou-a a uma mata densa, estranha àquele cenário anterior. Sons de tambores e atabaques surgiram e cresceram enquanto continuava na inesperada perseguição. Depois de poucos minutos, chegara ao fim da trilha. O rapaz havia sumido. A música havia sumido. Mas algo aparecera. Gota a gota.
"Você não pode se esconder de mim", disse com um sorriso entre os lábios. À sua frente, um tronco de árvore, mui largo e ferido por algum lenhador qualquer, formara por alguma razão um pequeno recipiente d'água. Suas gotas surgiam do interior do tronco, e o líquido transbordava. Olhou para dentro. No meio deste, surgindo do éter, uma vitória-régia resplandecera, brônzea, porém tão leve...
A mata havia sumido. O vulto havia sumido. Ficara apenas o tronco, e uma voz ao longe: "Você é minha, agora... Só minha."

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